Olá! Espero que você se divirta com mais esse texto. Quero ouvir sobre suas lembranças também. Caso você também escutava essas músicas - uma delas eu tenho certeza que sim! - me conta aí como era na época, e o que você sentia. Vou gostar de ler.
A seguir, o texto dessa semana.
MIDNIGHT OIL - The Dead Heart
Diesel and Dust, 1987
Midnight Oil é uma banda que faz parte da minha vida desde 1997. Embora eu já conhecesse algumas músicas anos antes, mesmo sem saber exatamente que era Midnight Oil, fui ter contato mais próximo com o grupo graças ao clipe de Surf's Up Tonight, que tocava bastante no programa Tele Ritmo, da TV2 Guaíba, com apresentação de Clovis Dias Costa. Inclusive, em 1997, teve um show deles em Porto Alegre, que infelizmente não pude ir devido à tenra idade e questões logísticas.
Em 1999, fuçando na mesma prateleira da minha tia que eu já tinha escutado o disco do Bruce Springsteen que eu escrevi no texto da semana 2 (se não leu, leia depois), apareceu o Diesel and Dust. A música de abertura, Beds Are Burning, é um grande clássico. Mas a que mais me impactou de verdade, e a que mais me remete à sensação de nostalgia, claramente é The Dead Heart. Essa música me faz lembrar de uma porção de coisas. Me lembra da última vez que fui para Mostardas quando meu avô ainda era vivo, para comemorar o aniversário de 17 anos do meu primo Marcos. Me faz lembrar de um passeio para Dois Irmãos num domingo à noite para dar um prejuízo homérico no café colonial do Santa Cecília. Me faz lembrar de peças de teatro que apresentávamos no Centro Cultural de Sapiranga em um tenebroso inverno que ocasionou muita amigdalite e febre. Me faz lembrar da época que meu pai trabalhava no TI de uma distribuidora de bebidas da Antarctica e conseguia trazer para casa, a preços módicos, um engradado de Guaraná Polar por apenas R$ 7,00. Me faz lembrar da época que eu varria as bancas atrás de revistas sobre tênis, já que o Guga tinha vencido dois Super9 (atual Masters 1000) seguidos e chegou às quartas-de-final de Roland Garros, onde milagrosamente o Fernando Meligeni chegou às semis e conseguiu a melhor campanha do Brasil naquele ano. Tudo isso sem ainda ter o disco em casa.
Comprei o Diesel and Dust em setembro de 1999, na Jam Sons Raros, junto com o Ten, do Pearl Jam, e o Hot20, dos Replicantes. Embora eu gostasse daquele punk bastante bobo dos Replicantes, o primeiro disco do Pearl Jam não desceu tão bem quanto o Vs., segundo disco deles. Meu CD queridinho daquela leva foi o Diesel and Dust, que tocava sem parar. Confesso que talvez Dreamworld e Sometimes tenham sido as músicas que eu mais ouvi do disco, minhas preferidas da época, mas nenhuma delas tem o mesmo impacto visceral da nostalgia quanto The Dead Heart. Esses dias mesmo, andando de carro com a Etti, essa música tocou do nada na 102.3 FM, a rádio que estávamos escutando no momento. Falei para ela, na hora, que essa música merecia um texto, por representar imediatamente a imagem de uma época que nunca mais vai voltar.
Com o passar dos anos fui virando um grande entusiasta do Midnight Oil e todas as fases da banda. Desde a post-punk do final dos anos 1970, à surf music dos anos 1980 e depois ao pop mais adulto dos anos 1990, essa é uma banda que merece ser ouvida com mais atenção por quem por ventura só conheça os hits. Talvez daqui um tempo eu faça uma playlist com minhas favoritas deles e mande pra cá. Enfim, The Dead Heart tem essa aura mágica de abrir o portal do tempo e, por isso, com certeza merece estar aqui no panteão das minhas faixas que abrem feixes na memória e no coração - que ainda pulsa bem vivo, ao contrário do título da música.
MAMONAS ASSASSINAS - Mundo Animal
Mamonas Assassinas, 1995
O ano de 1995, junto com o de 1990, foi o mais feliz da minha infância. Talvez 1995 seja o melhor ano da cultura pop dos anos 1990. A enxurrada de acontecimentos foi inacreditável, principalmente para uma criança de 10 anos de idade - meu caso, na época. O advento da revista Herói, no final de 1994, mas que se consolidou mesmo a partir de 1995, foi um marco na minha geração. Serviu como norte para cobertura de cultura pop no Brasil. Tive a ideia de eternizar isso no meu trabalho de conclusão de curso em 2012, enaltecendo o pioneirismo editorial da publicação, que fez muita gente ler no Brasil graças à exploração de fenômenos da época, como Os Cavaleiros do Zodíaco, Power Rangers, Street Fighter, Mortal Kombat, filme do Batman, a chegada dos videogames da geração 32 bits, entre outros. Ainda em 2012, tive o privilégio de me tornar parte da equipe e fui editor do site por 2 anos, além de ter participado de dois livros da Herói. Se alguém dissesse para o Matheus da época, que juntava moedas para comprar a Herói nas bancas toda sexta-feira, que 20 anos depois ele escreveria para a Herói, eu ia achar que a pessoa tava maluca. Maluco tava eu de não confiar em mim.
Entre tantos fenômenos que 1995 nos proporcionou, como o thriller policial A Próxima Vítima, novela das 20h de Silvio de Abreu, e a estreia dos episódios inéditos de Cavaleiros do Zodíaco na Manchete, nem mesmo eles chegaram perto do sucesso midiático dos Mamonas Assassinas. O que esses caras fizeram de julho de 1995 até o fatídico acidente em março de 1996 jamais vai ser igualado. Um mar de bobagem envelopado numa banda com carisma acima da média, cheia de bons músicos, e com letras infantis que acertaram em cheio diversos públicos simultaneamente. Não existia uma casa da época que não tivesse o CD ou a fita (pirata!) dos Mamonas Assassinas. Era quase uma unanimidade. Se em números oficiais eles venderam mais de 2 milhões de cópias, na informalidade esse número deve ter batido na casa dos 10 milhões tranquilamente. O ano de 1995 era uma beleza para a pirataria. O dólar valia menos que o real, os camelôs e lojinhas de R$1,99 bombavam. O arsenal de fitas K7 aqui em casa era variado, ia desde o cantor Falcão, passando por Olodum, Grupo Molejo, Raça Negra até coisas como Paralamas do Sucesso, Skank e Raimundos.
O disco dos Mamonas foi impactante demais para a cultura pop. Na época que o álbum completou 25 anos de lançamento, em 2020, participei do podcast Jooqebox, dos amigos Leandro e Lipe. Lá falamos sobre a obra com minúcias, faixa a faixa. Mundo Animal era a música que abria o lado B da fita k7. Era uma paulada com um riff de hard rock que descambava para outros ritmos simultaneamente, e que ao vivo ficava ainda melhor. Dinho tirando sarro da escatologia da fauna era um convite para todas as crianças da época o imitarem. Da mesma forma que várias músicas do Lavô tá Novo, dos Raimundos, Mundo Animal era entupida de frases de efeito, onde a veia "poeteira" da banda saltava aos olhos. Quem pariu uma pérola como "Aí vem a rajada, de sua bazuca anal / Já tem pomba com mira a laser/ O tiro sai sempre fatal" viverá eternamente na quinta-série. Esse era o espírito da banda. Espírito que repousa eternamente naquele ano de 1995, junto com todas as lembranças e alto astral que nos passavam.
Essa semana fez 26 anos que eles se foram. As pessoas tendem lembrar mais da tragédia do que do impacto que eles tiveram nos meses anteriores. Eu guardo sempre essa lembrança boa, de que eles fizeram parte da trilha de um dos melhores anos da minha vida, salvo principalmente pelo Ajax em Tóquio. Um ano em que os Mamonas nos proporcionaram momentos de inacreditáveis risadas, além de encher as crianças da época com uma pá de referências, sem que ao menos percebessemos - eu nunca tinha ouvido Should I Stay or Should I Go na vida e já reconhecia os riffs graças à Chopis Centis. Garanto que muita gente teve o primeiro contato com um som mais pesado graças a Debil Metal, onde satirizavam bandas que cantavam em inglês e ninguém entendia porra nenhuma, e por aí vai.
O segundo semestre de 1995 vai ficar sempre na minha memória. A quarta-série e as aulas de arte na Escola de Arte & Educação com a prof. Marilúcia, os amigos do Ildefonso Pinto, se reunindo todo recreio para jogar bola e ficar cantando quase que o disco inteiro dentro da sala de aula, as excursões para Porto Alegre, os finais de semana na casa dos parentes e amigos jogando Super NES e ouvindo fitinha pirata. A trilha sonora dessa época com certeza sempre vai ter Mamonas Assassinas em destaque. É o retrato de uma época em que fomos felizes. Garanto que eles também foram.
Até semana que vem.
Matheus
É, é estranho pensar nisso. Final de novembro de 1995, eu em Taguatinga, passando férias, indo de fliperama em fliperama pra levantar uma grana e comprar boneco de X-Men que tinha baratão na Americanas, com o walkman que eu tinha ganho da minha avó e uma fita desse disco do Mamonas.
Cara, esse aqui foi o melhor post até agora!! Estou impressionado e já li 2x! hueheuheuhe! Muito legal esse lance de resgatar memórias da vida pessoal que se misturam com o que o mundo estava sentindo e experimentando na época. Quem tem a mesma idade (tipo eu) consegue embarcar no saudosismo por tabela e revisitar essas lembranças que, graças a resgates descontraídos e super pessoais como esse, parece que trazem de volta as cores e cheiros de uma época que se foi deixando saudade. E, sim: somos de uma geração irremediavelmente marcada pelo sucesso meteórico dos Mamonas. Muito bom, cara!